Páginas

Translate

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Dietética Chinesa

Se algo está frio, deve ser aquecido. Se algo está quente deve ser arrefecido"    Huangdi Neijing

"Aquele que toma medicamentos e negligencia os alimentos, desperdiça as habilidades do médico." ​
Provérbio chinês


A dietética é um dos fundamentos da Medicina Tradicional Chinesa (MTC), que vê a saúde como o equilíbrio energético do homem. Um bom médico da MTC não trata doenças, mas sim preserva a saúde. Pensando assim percebemos a importância fundamental dos nossos hábitos diários, em especial os alimentares.
Enquanto no mundo ocidental a alimentação é vista como ingestão de diferentes componentes nutricionais como as proteínas, hidratos de carbono, gorduras, sais minerais, na China os alimentos tem uma natureza energética, temperatura e como tendo 5 sabores utilizando os mesmos para a manipulação das condições do corpo e da busca do equilíbrio.

Como já referimos noutros artigos, na MTC a energia tem duas qualidades: Yin e Yang. Os elementos têm então uma “graduação” de energia yin e yang, geralmente com uma predominância, por exemplo: leguminosas, sementes, carnes, são predominantemente yang, enquanto raízes e bulbos, assim como a carne e peixe, têm características mais yin. Acredita-se que os alimentos yin são mais nutritivos e calmantes, e os yang mais estimulantes. Assim de maneira geral os yin são recomendados para a noite, a fim de proporcionar um bom sono, e os yang para o dia pela vitalidade necessária para as actividades diárias.




Os alimentos também obedecem à Lei dos Cinco Elementos, que relaciona diversas características com os elementos Água, Madeira, Fogo, Terra e Metal. Na dinastia Shang (séc. XVI ao XI a.C.), o intelectual Yi Yin elaborou uma teoria a que chamou “harmonia dos alimentos” em que ele relacionou os cinco sabores: doce, azedo, amargo, picante e salgado, às necessidades nutricionais dos cinco principais sistemas de órgãos do corpo: coração, fígado, baço/pâncreas, pulmões e rins e enfatiza o seu papel na manutenção da boa saúde.
Por exemplo, o sabor azedo é relacionado ao elemento Madeira, tonifica os sistemas energéticos relacionados ao fígado e á vesícula biliar. Dependendo da intensidade da acidez, pode aumentar a circulação ou ao contrário, causando uma contracção, diminuí-la. Considera-se também que o “exagero” do sabor origina um alimento “venenoso”, ou tóxico, no caso do doce, por exemplo, o açúcar.
Adequar a alimentação e saber dos seus efeitos sobre o nosso corpo é saber a maneira de se intervir nos casos do vazio ou da plenitude dos órgãos e das vísceras, através desse conhecimento a MTC elaborou todo o procedimento para repor os gastos energéticos e da matéria, proporcionar a vitalidade e a longevidade celular, evitar os processos degenerativos, o envelhecimento precoce e, principalmente, o aparecimento de doenças graves. No quadro em baixo estão resumidas algumas das características:




Elemento
Sabor
Exemplo de alimentos
Meridiano
Efeito
Tóxico
Efeito Negativo
Água
Salgado
frutos do mar, gergelim, repolho roxo, fígado, algas, pretos
Bexiga e Rim
Diurético
salmouras e conservas
medo
Madeira
Azedo
caules, folhas verdes, kiwi, pistache, verdes
Fígado e Vesícula Biliar
actua sobre a circulação
vinagre
irritabilidade
Fogo
Amargo
alface, acelga, jiló, boldo, repolho roxo, morango, tomate, beterraba
Coração e intestino delgado
calmante
tabaco
instabilidade emocional
Terra
Doce
raízes, arroz, abóbora
Estômago e Baço-Pâncreas
calmante
açúcar
compulsão, ansiedade
Metal
Picante
gengibre, alho, hortelã, folhas, arroz, banana, aipim, nabo, alimentos brancos
pulmão e intestino grosso
desintoxicante, dispersor de vento e calor
álcool
tristeza

O ideal é observar quais as deficiências e excessos energéticos de cada pessoa e formular a dieta para contrabalançar qualquer desequilíbrio.
No caso de uma pessoa saudável, para preservar e cultivar a saúde perfeita, a dieta deve contemplar equilibradamente todos os elementos, mas é claro que as relações não são tão óbvias. Vejamos sabores e qualidades:  

  1. Picante, dispersor. Utilizado para dispersar factores patogênicos (porém pode dispersar o Qi - deve ser evitado portanto quando este se encontra deficiente). Se o Fígado está alterado, evitar o sabor Picante (relacionado ao elemento METAL, que domina MADEIRA), estimulam a digestão, aceleram o metabolismo e fazem transpirar;
  2. Doce, tonificante. Equilibra e acalma. Utilizado para tonificar deficiências e eliminar dor. Como atinge músculos deve ser evitado em casos de debilidade muscular. Se o Rim está afectado, evitar alimentos doces (porque TERRA domina ÁGUA), fazem crescer, tonificam e hidratam;
  3. Amargo elimina o calor, seda e enrijece (elimina a humidade-calor e domina a Rebelião do Qi). Atinge ossos, deve ser evitado nas patologias ósseas. Se o pulmão está a afectado, evitar alimentos Amargos (relacionados com o FOGO, que domina METAL), secam as mucosidades, favorecem a descida/drenagem e evacuação;
  4. Salgado, amacia a rigidez. Utilizado para tratar a constipação e o edema. Pode ressecar o sangue, deve ser evitado em casos de deficiência de sangue. Se o coração está alterado, evitar o sabor Salgado (porque a ÁGUA domina FOGO), em quantidade moderada, lubrificam e humedece;
  5. Azedo, produz fluídos e Yin. É adstringente e pode controlar a perspiração e a diarreia. Atinge os nervos e pode afectar o fígado, deve ser evitado se o paciente sofre de dor crónica. Se o baço está alterado, evitar o sabor Azedo (relacionado ao elemento que o domina, MADEIRA), contraem a energia para dentro.





A MTC considera também as propriedades térmicas intrínsecas energéticas dos alimentos:

  1. alimentos quentes: tonificam, aquecem, elevam, movem
  2. alimentos neutros: estabilizam, hormonizam, centram
  3. alimentos frescos e frios: refrescam, sedam, adstringem e hidratam

Os alimentos são diferenciados pelo efeito que têm sobre o organismo. Por exemplo, um alimento pode ter um efeito de arrefecimento ou de aquecimento ou hidratar um órgão específico (os pulmões, ou o intestino grosso por exemplo).
Esta lógica de ver a alimentação nada tem a ver com o pensamento nutricional da nutrição ocidental. Também não significa que seja a única maneira de ver alimentos e hoje em dia as 2 versões complementam-se perfeitamente na prática clínica.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Moxabustão - 1ª parte

A moxabustão é uma técnica milenar terapêutica da Medicina Tradicional Chinesa. Baseia-se nos mesmos princípios e conhecimentos dos meridianos de energia utilizados na Acupuntura, sendo amplamente utilizada noutros sistemas de Medicina Oriental tradicionais como: Japão, Coreia, Vietname, Tibete e Mongólia.
É originária do Norte da China, e moxabustão - Jiu (pinyin), significa literalmente “longo tempo de aplicação do fogo”, é considerada uma espécie de acupuntura térmica.
Visa prevenir e tratar doenças pelo aquecimento de pontos de acupuntura através da queima de ervas medicinais. A erva mais utilizada é a Artemísia sinensis e Atermísia vulgaris. Também podem ser utilizados outros materiais como o carvão, que apresenta um odor mais suave. 
Artemísia 




A Moxabustão já era realizada pelas famílias reais quando a Acupuntura falhava. Segundo os textos chineses antigos, todas as pessoas que desejam ter uma vida longa e saudável devem realizar moxabustão em pontos específicos do corpo.
A cauterização, da qual deriva a moxa, foi um desenvolvimento que se seguiu ao uso do fogo. Considerou-se que o aquecimento e a sensação de bem-estar que o fogo proporcionava á vida nas cavernas frias e húmidas, assim, como as curas furtivas que, ocasionalmente, aconteciam do toque de um carvão acesso ou pedaço de lenha em brasa, foram os primórdios da cauterização.
Na cauterização como método de curar doenças usava-se, originalmente, ramos e outros materiais combustíveis comuns. O uso de plantas como principal substância de combustão, data do último período Chou. O livro de Mencios (290 a.C.), refere-se a esta planta (Artemísia) “para uma doença de sete anos, procure moxa de três anos de idade”. Isto sugere que o seu uso já era difundido naquele tempo.

O preparo da erva

As folhas de Artemísia são colhidas na Primavera depois são lavadas, expostas ao sol para secarem, trituradas e peneiradas para remoção de areia ou talos grosseiros, até se transformarem numa massa uniforme, semelhante a uma lã vegetal – a moxa. Após preparada, a moxa pode ser moldada de diversas formas para a sua utilização: as mais usuais são bastão e cone.
A Moxabustão pode ser direta ou indireta. A Moxabustão direta é realizada directamente sobre a pele e pode ocasionar bolhas ou cicatrizes. O tipo de moxa a usar deve ser extremamente fina, para que se possa ser amassada e moldada com as mãos os minúsculos cones de forma a ficarem firmes para que não se desfaçam. Geralmente não é utilizada pelos médicos acupunturistas. A Moxabustão indireta realizada com o bastão de Moxabustão é o método mais usado actualmente, a uma distância de 1 a 2 cm da pele. Não é necessário ser tão fina, e é enrolada fortemente em papel especial de cerca de 15 cm de comprimento para formar o bastão. A Moxabustão indireta também pode ser realizada sobre fatia de gengibre, camada de sal, caixa de madeira, sobre o cabo da agulha, moxa adesiva.
Antigamente, praticava-se geralmente o método de cauterização directa. As instruções são encontradas no tratado Tradicional de Zuo (581 a.C.), “acima ou abaixo dos vitais, a cauterização directa não pode ser usada”. Num outro livro “O livro dos segredos de Bian Que”, é mencionado fazer-se moxa para as pessoas dormirem. O clássico de Medicina da Dinastia Han Oriental “Discussão das doenças causadas pelo frio”, refere as doenças para o qual a cauterização directa é permitida ou proibida.
Moxabustão directa (com cone); Moxabustão indirecta (com bastão)

Naquele tempo, o tamanho da mecha ou cone de moxa era grande e para cada tratamento um grande número de moxa era usado. Mais tarde, nas Dinastias Tang e Song, eram prescritos mais de 100 cones de moxa. Durante as Dinastias Jin e Tang, foi desenvolvido um método de cauterização indirecta, no clássico “Receitas dos mil ducados”, vários métodos são discutidos, incluindo colocar a moxa sob um folhado de outros materiais, tais como alho, feijão-soja, cera de abelha, sal ou gengibre, e então queimá-la, no mesmo livro, é descrito um método para tratar doenças auriculares através do qual um tubo de bambu vazio é colocado no orelha e a moxa queimada na outra ponta. Este método era denominado de cauterização com tubo ou cilindro e foi o percursor da técnica moderna do “cilindro aquecido” (bastão).

Um outro método desenvolvido recentemente e que tem conseguido bons resultados é a Moxa Elétrica, um aparelho projectado para aquecer os pontos de acupuntura, simulando a Moxabustão indireta com uso de bastão de A. vulgaris.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Fitoterapia Chinesa (cont.)

Hoje continuamos o antigo anterior sobre a fitoterapia chinesa. Classificamos as plantas pelas suas propriedades e sabores e as suas aplicações.

Propriedade das plantas (medicamentos)

O universo é composto de várias forças: a complementariedade oposta do Yin e Yang e os Cinco Elementos. No Shang Han Lu, o autor separa as agressões externas ( vento, frio, calor, humidade, secura) dos factores internos (alegria, medo, raiva, melancolia, preocupação) como causas das doenças. Ele distingue as energias que causam perturbações das infecções por penetração de um agente nocivo.
Desta forma, podemos classificar as plantas:
  • pelas suas propriedades térmicas: quentes, mornas, frias, frescas, podendo ainda falar-se de uma quinta propriedade, neutra;
  • pelos cinco sabores: azedo (ácido), amargo, doce, picante e salgado, teoria elaborada por Chou Li em 770-476 a.C.;
  • pelas quatro direcções: ascendente, descendente, circulante (flutuante) e submersão. Sistema classificação geralmente atribuido a Li Tung 1180-1251 d.C..

As ervas com propriedades mornas ou quentes são Yang em natureza. Elas dispersam o vento e o frio interno, aquecem o Baço e o Estômago, reabastecem o Yang, também possuem acções estimulantes e fortalecedoras, ervas dessa natureza incluem por exemplo o acônito, gengibre seco, canela e tratam várias doenças do frio.
As que contém propriedades frescas ou frias tais como: coptis, scutellaria, gypsum e gardénia são Yin em natureza. Elas removem o calor, aliviam a inflamação patogénica, acalmam os nervos devido à sua acção inibitória, servem também como antibióticos, sedativos e antiflogisticos para doenças febris.

Devido á variação na constituição corpórea, a circulação do Qi (energia), sangue e meridianos, assim como as manifestações externas da doença, as ervas com a mesma classificação com frequência diferem nos seus efeitos terapêuticos.
Cada um dos cinco sabores, determinados a partir de experiências a longo prazo, tem as suas próprias funções específicas. Geralmente as plantas de sabor picante exercem efeitos de dispersão e promoção, assim, as ervas picantes como gengibre fresco, perilla e menta dispersam os patógenos externos; as de sabor doce de tonificação e regulação, o ginseng nutre o Qi e o alcaçuz alivia a dor ; as de sabor amargo efeitos fortalecedores e purgantes, o coptis e o melão amargo têm a acção de secar a humidade e são purgantes; as de sabor azedo efeitos adstringentes,como as algas marinhas; e, as de sabor salgado efeitos suavizantes e purgantes. As ervas suaves, sem sabor, tais como Hoelen e Akebia, são diuréticas.

As ervas Ascendentes e Circulantes têm um efeito para cima e para fora, usadas para activar o Yang, induzir á transpiração e dispersar o frio e o vento. Em contraste, as Descendentes e de Submersão, possuem um efeito para baixo e para dentro – elas tranquilizam, causam contracção, aliviam a tosse, interrompem o vómito e promovem a diurese e purgação.

Como uma das teorias fundamentais na Medicina Herbária Chinesa, as quatro direcções relacionam-se aos diferentes estados de doença no organismo humano. Assim as plantas mornas, quentes, picantes e doces são classificadas como ascendentes e circulantes por natureza, enquanto as frias, frescas, azedas, amargas e salgadas têm acções descendentes e de submersão. As ervas suaves e leves tais como flores e folhas normalmente possuem qualidades ascendentes e circulantes enquanto as ervas túrbidas e pesadas tais como sementes e frutos possuem efeitos descendentes e de submersão.

O especialista em Fitoterapia Chinesa pode mudar as características de uma droga processando-a ou formulando-a de maneira que se ajuste ás necessidades da doença. As ervas cozidas numa solução salgada ou vinagre torna-se descendente ou de submersão. As ervas cozidas em vinho ou com gengibre tornam-se ascendentes e circulantes nas suas características. Na Medicina Chinesa, a acção farmacológica da combinação de mais de duas ervas é chamada de “os sete efeitos das drogas”. Após séculos de uso empírico de remédios herbários, os médicos chineses descobriram que os efeitos de ervas isoladas mudam de acordo com o ambiente herbário. Algumas combinações intensificam uma acção enquanto que outros tornam-se tóxicas ou reduzem a efectividade.
Esses efeitos farmacológicos de uma combinação herbária são difíceis de analisar porque a fórmula pode consistir de qualquer parte de quatro a doze ervas individuais que interagem entre si, ocorrendo três tipos de interacções.
- Entre as ervas individuais.
- Entre os constituintes das ervas individuais.
- Entre os constituintes de ervas diferentes.
Os efeitos farmacológicos das combinações herbárias sobre o organismo humano provaram-se muitos complexos. Isto demonstra que a fitoterapia chinesa na sua complexidade provou a sua eficiência no decorrer dos séculos, assim como na actualidade.


Devemos conservar o que se tem de mais precioso: O corpo, a Energia Vital dentro do corpo, o Sangue e a mente tranquila. Por isso a maioria dos fitoterápicos são de carácter preventivo, não deixar o corpo adoecer.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Fitoterapia Chinesa


A área da Fitoterapia Chinesa é frequentemente mal compreendida no Ocidente devido à escassez de material bibliográfico que trate o assunto com a profundidade necessária.  Devido à sua estrutura complexa frequentemente nos deparamos com erros básicos devido a uma má interpretação das suas regras gerais.




Fitoterapia, literalmente quer dizer, terapia através de plantas, é conhecida na China há mais de 3 mil anos numa época quem que os livros eram escritos em pergaminhos, casco de tartaruga e seda. Uma fórmula fitoterápica chinesa poderá englobar 6 ou mais plantas, desta forma, neste método são combinadas em proporções que maximizam os seus efeitos e inibem possíveis efeitos colaterais. O conhecimento destas combinações e proporções é fruto de milhares de anos de experimentação e pesquisa.



Ao longo dos séculos vários autores se debruçaram e publicaram diversos livros sobre as substâncias medicinais. Na época da última Dinastia Han (25-220 d.C.), quando os clássicos foram compilados, surgiu a Matéria Médica Clássica do Esposo Divino e Discussões de Desordens Induzidas pelo Frio (Shang Han Lu) de Zhang Zhong Jing, os quais são as fontes de todas as prescrições utilizadas até hoje. Estas Fórmulas encontram-se nos livros em diversos idiomas e são utilizadas e estudadas em quase todos os países.  
Para se fazer uma fórmula na Fitoterapia Chinesa é preciso conhecer-se as capacidades energéticas, curativas e sinérgicas das ervas, ou seja, a interacção de uma planta com as outras. Na formulação chinesa existe uma erva Imperador, que vai determinar a acção da fórmula, as ervas Ministros, que ajudam a potencializar a acção do Imperador, as suas ervas Assistentes que são necessárias para o bem estar da pessoa e cuidam do estomâgo para que este receba a fómrula, e por fim as ervas Mensageiras que levam as ervas para o local necessário.


O povo acreditava na sua habilidade de observar e entender a natureza, a saúde e a doença eram objectos dos princípios da ordem natural. A Fitoterapia Chinesa não pensa em cura mas em equilibrio, pois o organismo busca a auto-cura.